A
A
Balde
Teclado

Artigo Relações do Trabalho: Por que a ultratividade não deve voltar?

12 de abril de 2023

Por Eduardo Pastore*

Antes da reforma trabalhista de 2017, instituída pela Lei 13.467/17, tudo o que era negociado pelos sindicatos perpetuava-se , a não ser que houvesse outra negociação coletiva, prevendo distintos direitos. Ou seja, reajustes salariais, carga horária, pacotes de benefícios, regime de horas-extras e eventuais bônus, dentre outros itens acordados, incorporavam-se ao contrato de trabalho dos funcionários.

Esse instituto legal, denominado ultratividade, foi extinto pela reforma. Motivo: entendeu-se, à época, que as negociações coletivas haviam parado devido à perpetuação de direitos. O diagnóstico mostrou-se correto, pois, após 2017, as negociações coletivas voltaram a acontecer com intensidade. Isso deu às empresas a flexibilidade necessária para conceder benefícios e prerrogativas aos seus colaboradores, exatamente porque não mais se perpetuariam.

Assim, ao extinguir a ultratividade, a Lei 13.467/17 deu novo fôlego às organizações. Foi um ganho imenso para empregados e empregadores e um avanço nas relações de trabalho. A reforma melhorou bastante o perfil das negociações coletivas, que se tornaram mais adequadas às transformações do Brasil e do mundo, e agregou mais qualidade à interação entre as partes.

Portanto, a eventual volta da ultratividade significaria forte retrocesso, imporia novamente o desestímulo às negociações e elevaria muito o risco de precarização das relações de trabalho. Por isso, é preocupante verificar que há um movimento em curso pelo restabelecimento desse modelo anacrônico, liderado por sindicatos laborais.

O argumento utilizado para justificar o retrocesso não resiste a uma análise mais aprofundada. Alega-se que, para se instalar um dissídio coletivo, ou seja, para que sindicatos laborais e empresariais resolvam suas questões no Judiciário trabalhista, é preciso haver concordância da outra parte. Ou seja, se o sindicato empresarial não quiser instalar o que se denomina de dissídio coletivo, basta manifestar esta vontade para que as questões não sejam remetidas à Justiça. Ao se negar que se instaure dissídio coletivo, não há negociação.

Para alguns sindicatos laborais, sem a ultratividade e com o direito de o sindicato patronal negar-se a solucionar as questões na Justiça, os empregados seriam os mais prejudicados. Porém, os que defendem o retrocesso, sob a questionável justificativa de defesa e mais proteção aos trabalhadores, desconsideram a capacidade econômica das empresas.

Nenhuma organização pode arcar com obrigações e compromissos que extrapolem suas possibilidades financeiras. Impor-lhes isso significa conspirar contra a criação de empregos formais e dificultar a geração e manutenção de postos de trabalho. Quando há flexibilidade para se negociarem direitos que não se perpetuam, para mais ou para menos, haverá sempre a possibilidade de as empresas, dependendo de seu momento econômico, sentirem-se estimuladas a proporcionar mais benefícios aos seus colaboradores.

*Eduardo Pastore é advogado trabalhista, especialista em relações do trabalho